O efeito "Kiss"


As tragédias no Brasil nada ensinariam a não ser a pronta mobilização de recursos públicos que tão rápido quanto disponibilizados terminam no bolso de algum gestor público e apadrinhados. A destruição das cidades serranas no norte fluminense – Petrópolis, Itaipava, Teresópolis e outras em razão de fortes chuvas em 2011 - ainda tem parte da população carente não  assistida, principalmente na reconstrução de suas casas, apesar de recursos  públicos liberados para este fim. A mídia tem realizado reportagens investigativas denunciando o desvio dos recursos públicos por gestores púbicos e outros. O contraponto é o Japão e a impressionante agilidade para recuperar parte das áreas destruídas com o terremoto e tsunami em tempo recorde de uma semana.  Atribui-se ao professor San Tiago Dantas (1911-1964) uma frase segundo a qual “a Índia tem uma grande elite e um povo de bosta, o Brasil tem um grande povo e uma elite de bosta”. Aproveito esse gancho para discutir aqui um projeto que poderia estar produzindo insônia em muitos proprietários de imóveis comerciais em Dracena convocados para adequar estes com um sistema de combate a incêndio determinado pelo Corpo de Bombeiros conforme normas do Estado.
O Corpo de Bombeiros, de viés civil, é uma instituição inegavelmente respeitada mundialmente pelos importantes serviços que presta à sociedade. A ditadura militar, felizmente, não logrou exito em transformar o Brasil num grande quartel com o golpe de 1964, mas teve sucesso em definir os contornos de algumas instituições com corte militar como, por ex., o Corpo de Bombeiros. O que importaria é a eficiência da instituição, responsabilidade e prontidão para melhor atender ao cidadão. Entretanto, a (boa) imagem do Corpo de Bombeiros sofreu arranhões com “soldados” da corporação na cidade do Rio de Janeiro flagrados em ilícitos como o tráfico de drogas, armas e furtos. E mais recentemente com o desgraçado evento da boate Kiss na cidade de Pelotas, RGS, que expôs tragicamente as mazelas dos serviços públicos bem conhecidos pela população brasileira como a prevaricação, corrupção e a total falta de sintonia e compreensão na gestão da “coisa pública”. O Brasil avança sempre a reboque dos eventos, geralmente trágicos como mostram os fatos e, mesmo assim, devagar, paquidérmico, parecendo querer empurrar com a barriga aquilo que urge transformar. Contaria com ação do tempo para não mudar o “status quo” que interessaria a poucos manter porque lucrativo. Parodiando um ex-presidente “sartreano”, contraponto ao torneiro, “assim não dá, assim não pode”. E não poderia mesmo!
As exigências do Corpo de Bombeiros de Dracena aos edifícios comerciais de determinadas dimensões para adotar um sistema de combate a incêndio se tornaram urgentes no rastro do “efeito Kiss”. Contudo essa instituição não esta disponível para prestar assistência ao cidadão que deve assumir a responsabilidade solitária de desenvolver o projeto, executar a obra e contar, posteriormente, com a aprovação desta. A boa ética recomendaria, entre outras, não facilitar as coisas para si mesmo, porém é isto mesmo que o Corpo de Bombeiros faz ao não prestar a devida assistência técnica e transferir o ônus da construção desse sistema de prevenção a incêndio, geralmente superdimensionados e de elevados custos, para o cidadão. Ops, assim é muito fácil gerir a coisa pública ao transferir obrigações do Estado para o cidadão. Cadê os hidrantes nas ruas que poderiam dar conta do recado? Numa cidade do tamanho de Dracena hidrantes bem localizados seriam suficientes para bem atender a sinistros, assim como carros pipas. Mesmo não conhecendo as normas para um sistema de combate a incêndio pareceria fora de propósito a construção de uma caixa d´água em aço com 12 m3 de capacidade num edifício de pouco mais de 700 m2 e que tem um único lance de escada larga (1,5m), extintores corretamente dimensionados e alocados e moderna rede elétrica.  Para o Corpo de Bombeiros nada disso importaria a não ser a pronta disposição de facilitar o trabalho para si mesmo, pois precisaria preservar uma imagem não associada a incompetência, prevaricação, ou  pior, corrupção.  Seria de bom alvitre o Corpo de Bombeiros abandonar a soberba e se aproximar do cidadão contribuinte para prestar a devida assistência. Isso é obrigação do Corpo de Bombeiros e direito do cidadão!

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